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“Como Ser Livre
Reconhecer a verdade como verdade, e ao mesmo tempo como erro; viver os contrários, não os aceitando; sentir tudo de todas as maneiras, e não ser nada, no fim, senão o entendimento de tudo - quando o homem se ergue a este píncaro, está livre, como em todos os píncaros, está só, como em todos os píncaros, está unido ao céu, a que nunca está unido, como em todos os píncaros.”
(Fernando Pessoa, 'Teoria da Heteronímia')


O que fica depois de esquecermos o que aprendemos? Depurado pela memória, diz-se que esse remanescente de conhecimento que fica retido nas nossas mentes é o que chamamos cultura geral. É o que fica das experiências da nossa vida e do que nos ensinaram.

Também as revoluções se avaliam pelo que ficou depois de tudo passar. Quando o pó assenta e o quotidiano se sobrepõe à agitação, o que mudou e o que permaneceu? O que melhorou e o que se tornou pior? Como se comparam as vidas das pessoas vulgares como nós às vidas dos seus pais ou avós?

Os portugueses, não sei porquê, geralmente menosprezam-se e ao que realizam. Se olharmos para o país que éramos há 50 anos e para o que somos agora a diferença chega a ser cruel! Pior ainda: há 50 anos a ausência de perspectivas era avassaladora, tanto individualmente como ao nível do país.

Quem hoje diz mal do SNS e das suas debilidades já não se lembra de quando ele não existia.

Quem vocifera contra o ensino público e as suas falhas já não se lembra quando o ensino era só para alguns.

Quem clama contra a justiça e os seus erros já não se lembra dos tribunais plenários e das prisões sem julgamento.

Quem hoje fala esqueceu-se do tempo em que não podia falar.

Por isso, antes de abrires a boca para reclamar pensa se não podes ser parte da solução em vez de falares só do problema.

Se podíamos ter feito melhor? Talvez. Mas também podia ter corrido bem pior. Toda a agitação e instabilidade que se seguiu à revolução podia ter-nos arrastado para os extremos, fossem eles de direita ou de esquerda. A verdade é que conseguimos aguentar-nos na racionalidade e no bom senso e que hoje, apesar de todos os defeitos que possa ter, temos uma democracia verdadeira. Há quem tenha demorado bem mais do que quatro décadas e meia a fazê-lo.

É certo que o tempo transformará inexoravelmente a data em efeméride ainda contemporânea para alguns e depois em feriado útil para pontes e mini-férias. Mas se, por todo esse tempo, continuarmos a ter a liberdade de escolher os nossos caminhos, terá valido a pena.

tuguinho e Kroniketas, diletantes preguiçosos armados em revolucionários de internet

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