Na Delidelux 1 - Cortes de Cima



Prosseguindo um hábito instalado desde há uns 4 anos a esta parte, temos diversificado as nossas presenças em provas de vinhos. Aquilo que começou por ser quase exclusivamente na Wine O’Clock foi-se estendendo a outras garrafeiras, tanto através do conhecimento por outros blogues, como por conversas nas provas em que comparecíamos e também, em boa parte, com o advento do Facebook. Assim, começámos a aparecer nas Coisas do Arco do Vinho, na Garrafeira Nacional, na Garrafeira Internacional, na Delidelux... À medida que as provas se multiplicavam, a escrita no blogue diminuía drasticamente, até chegarmos a um ano inteiro de inactividade, fazendo jus ao nosso epíteto, autoinfligido, de “diletantes preguiçosos”. Mas, embora não escrevendo, continuamos por aqui, vivinhos da costa e a provar bastante...

Fui assim com o Politikos, um dos mais habituais do Grupo gastrónomo-etilista “Os Comensais Dionisíacos”, à prova das Cortes de Cima, o produtor sediado no Alentejo próximo da Vidigueira, cuja propriedade é de uma americana e de um dinamarquês. Compareceram à chamada 5 tintos e 1 branco.

Começámos inevitavelmente pelo branco, um Sauvignon Blanc de uvas plantadas no concelho de Odemira, próximo de Vila Nova de Milfontes, com o objectivo de obter a frescura resultante da proximidade do mar e dum clima mais ameno. A verdade é que o resultado pareceu bem interessante. O vinho apresentava uma frescura e uma acidez vibrante que não são habituais nos brancos alentejanos saídos da canícula da planície. Aromas típicos da casta, com ligeiras notas de espargos, boa estrutura e final com alguma persistência, foi uma surpresa agradável. O preço nem tanto, mais de 10 €, mas é uma aposta que vale a pena.

Para os tintos foram chamados um Cortes de Cima, um Syrah, um Homenagem a Hans Christian Andersen, um Petit Verdot e um Touriga Nacional. A sensação colhida globalmente foi que se esperava algo mais. A marca que ostenta o nome da casa não deslumbrou, mostrando-se o Syrah algo chato, pouco exuberante de aromas e algo linear na boca. O Homenagem, também à base de Syrah, esteve um pouco mais vivo mas ainda assim algo linear, o mesmo acontecendo com o Touriga Nacional, ao contrário do esperado. Surpresa apenas para o Petit Verdot, a mostrar algumas notas de especiarias e alguma vivacidade na boca, prometendo crescimento em garrafa.

No final ficámos com uma sensação aquém das expectativas. Esperava-se mais daqueles vinhos tão bem conceituados. Por outro lado não pude deixar de observar este facto decepcionante: estávamos a provar vinhos produzidos no Alentejo com uma única casta alentejana (Aragonês, e vá lá, um bocadinho de Alicante Bouschet) e apenas mais uma portuguesa, a inevitável Touriga Nacional. Pouco mais, ali, nos ligava ao local de origem daqueles vinhos. Se nos dissessem que eram doutro sítio qualquer nós acreditávamos.

Será este o caminho que se pretende para os nossos vinhos, a total e completa descaracterização da sua região de origem? É que um vinho do Dão não é seguramente igual a um da Bairrada! E hoje em dia começa a ser difícil perceber o que é um vinho alentejano. Depois da disseminação da Touriga Nacional por todo o país, seguiu-se a proliferação das castas estrangeiras em quase todas as regiões, até chegarmos a este ponto de termos o nome duma região no rótulo duma garrafa e lá dentro um vinho feito unicamente com castas estrangeiras, as mesmas que são usadas na Califórnia, na Nova Zelândia, na Austrália, no Chile, na Argentina ou na África do Sul... Se é este o caminho, então para quê colocar a região no rótulo?

É verdade que há adeptos deste caminho, mas não creio que os apreciadores dos grandes vinhos de Bordéus ou da Borgonha (os que os podem beber, os que lhes têm acesso) esperem que estes sejam iguais a qualquer outro vinho produzido em qualquer lado. Felizmente ainda vamos podendo refugiar-nos nuns Bairrada e Dão clássicos que foram ficando esquecidos na garrafeira desde a década de 90...

Kroniketas, enófilo desaparecido e por vezes esclarecido

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